Por Pedro M. Guimarães Ferreira S.J*

Stephen Hawking é considerado uma das inteligências mais brilhante desta segunda metade do século. Físico e Cosmólogo, ele é o Lucasian Professor de Matemática em Cambridge (a mesma cátedra ocupada por Isaac Newton e Paul A. M. Dirac). Nascido em 1942, quando ainda estudante de universidade manifestaram-se os sistomas da doença ALS, que afeta os neurônios. Hoje está inteiramente entrevado, comunicando-se com as pessoas através de um sintetizador de voz. Seu cérebro, entretanto, continua ativíssimo, tendo brindado o público não especializado com o excelente livro “A Brief History of Time: From the Big Bang to Black Holes”, Bantam Books, 1988. Este livro fala muito sobre Deus, Hawking parece ser, decididamente, um crente. É o que veremos em várias passagens do livro.

Nossa imagem do universo

Este é o título do 1º capítulo do livro no qual, com precisão e erudição, ele discorre brevemente sobre as diversas Cosmologias ao longo da história da humanidade. Comenta que Santo_Agostinho compreendeu de forma genial que o tempo não existia antes de Deus criar o universo, pois o tempo é uma propriedade do universo.

Hawking diz então: “Pode-se imaginar que Deus criou o universo em qualquer momento, pode-se imaginar que Deus criou o universo no momento do big bang ou mesmo depois e de tal modo a nos fazer imaginar que houve um big bang, mas seria sem sentido supor que o universo foi criado antes do big bang. Um universo em expansão não inclui um Criador, mas coloca limites, quanto ao momento em que ele teria feito a coisa”. Creio que o que Hawking quer dizer é que se houvesse alguma coisa “antes” do big bang, esta coisa não seria o universo, precisamente porque a 2 partir do seu conhecimento nada se poderia prever quanto ao que ocorreria depois do big bang.

É interessante notar que, ainda neste capítulo, Hawking apela para um argumento “teológico” para se decidir a respeito do “estado inicial” do universo. Hawking diz que “parece que Deus criou um universo que evolui de forma regular, de acordo com certas leis. Portanto parece razoável supor que há leis governando o estado inicial do universo”. Hawking usa aqui o argumento inverso ao da 5ª via de São Tomás, que dizia: Há ordem no universo, portanto existe Deus.

No 3º capítulo, “O universo em expansão”, observa: “Muitas pessoas não gostam da idéia que o universo teve um início, provavelmente porque ela faz referência a uma intervenção divina” (“smacks of divine intervention”). E acrescenta, para confirmar, que a Igreja Católica declarou em 1951 que o modelo do big bang está de acordo com a Bíblia.

O 4º Capítulo, “O Princípio da Incerteza”, começa referindo o fato bem conhecido que Laplace, fundado na mecânica newtoniana, julgava que todo o universo, inclusive o comportamento humano, estava sujeito a um rígido determinismo. Tal determinação era rejeitada por muitos que achavam que infringia o poder de Deus de intervir no mundo. E mostra, como é bem sabido, que este determinismo foi radicalmente destruído pela física quântica na sua interpretação probabilística, que acabou sendo consensual entre os físicos. Mas Einstein (falecido em 1955) nunca aceitou que o universo fosse regido por probabilida des, resumindo seus sentimentos com a frase já referida, “Deus não joga dados”.

O 6º Capítulo é sobre os “Buracos Negros”, uma das descobertas mais fantásticas da ciência moderna. Depois de explicar o que são Buracos Negros, Hawking cita Dante a propósito do inferno: “Abandonai toda esperança vós que aqui entrais”.

Assim as singularidades provocadas pelo colapso gravitacional, os buracos negros, ocorrem só em lugares efetivamente “escondidos”, uma vez que são invisíveis. Isto leva Hawking a afirmar que “Deus tem horror da singularidade isolada”, parafraseando hipótese cósmica de Roger Penrose.

No 8º Capítulo, “A origem e o destino do universo” ele relata que (o livro é bastante auto-biográfico) durante a década de 7O ele estudou principalmente os buracos negros mas que a partir de 1981 seu interesse pela origem e destino do universo foi novamente despertado por ocasião de uma conferência organizada pelos Jesuitas da Specola Vaticana.

Este capítulo e o seguinte, “A reta do tempo”, são mais difícies. O autor especula bastante e a palavra “Deus” aparece com frequência nestas páginas. Assim, na pg. 122: “Estas leis [do universo] podem ter sido originalmente decretadas por Deus, mas parece que ele deixou, desde então, que o universo evoluísse de acordo com elas, sem intervir nele.

Na conferência de 1981 no Vaticano, Hawking apresentou um artigo em que propunha que o espaço-tempo não teria fronteira, tal fato sendo também previsto mais tarde pela teoria da gravidade quântica. [Os efeitos quânticos surgem quando as distâncias são pequenas e, usualmente, os efeitos gravitacionais tornam-se importantes em distâncias várias ordens de grandeza maiores. Mas quando ocorre o colapso gravitacional, os 2 efeitos se combinam devido à alta densidade da matéria]

O 10º Capítulo, “A Unificação da Física”, é também bastante especulativo, uma vez que esta unificação não está feita

Hawking comenta: “Alguns iriam argumentar a favor da 3ª possibilidade, dizendo que se houvesse um conjunto completo de leis, isto iria infringir a liberdade de Deus para mudar sua intenção e intervir no mundo. É um pouco como o velho paradoxo: 2 Deus pode criar uma pedra tão pesada que ele não possa levantá-la? Mas a possibilidade de Deus querer mudar a sua intenção é um exemplo da falácia, já apontada por S. Agostinho, de se imaginar Deus existindo no tempo: o tempo é uma propriedade somente do universo que Deus criou. Presumivelmente Deus sabia o que queria quando criou o universo”.

O último capítulo do livro, “Conclusão”, é o menor e o mais “teológico” de todos. Em apenas 4 páginas, a palavra “Deus” aparece 8 vezes e é, aliás, a última palavra do livro. É assim que o livro termina: “No século XVIII os filósofos estudavam todos os aspectos do conhecimento humano, incluindo as ciências, e discutiam questões tais como: O universo teve um início? Entretanto nos séculos XIX e XX a ciência tornouse muito técnica e matemática para os filósofos, sendo o domínio de um poucos especialistas. Os filósofos reduziram de tal modo o es-copo de suas investigações, que Wittgenstein, o mais famoso filósofo deste século, disse: “A única tarefa que sobrou para a filosofia é a análise da linguagem” . Que queda da grande tradição filosófica desde Aristóteles até Kant! Entretanto, se nós descobrirmos uma teoria completa, ela seria, com o tempo, inteligível nos seus grandes princípios, por qualquer um, não apenas por uns poucos cientistas. Então, todos nós, filósofos, cientistas e as pessoas comuns seremos capazes de participar na discussão do porque nós e o universo existimos. Se nós encontrarmos a resposta para esta pergunta, isto seria o triunfo final da razão humana, porque então nós conheceríamos a mente de Deus”.

* O autor é  especializado em Teoria Matemática de Controles. Seus estudos de Teologia e Filosofia foram feitos no Brasil e na Universidade de Innsbruck, na Áustria. Pós-Doutorado na PUC-Rio e COPPE/UFRJ) e nos EUA (Brown University e University of Califórnia at Berkeley). Professor titular do Departamento de Engenharia da PUC e Membro titular da Academia Nacional de Engenharia. É autor do livro A fé em Deus de Grandes cientistas. São Paulo: Ed Loyola, 2009.

Artigo completo aqui:

http://www.fplf.org.br/pedro_varios/Meus%20textos%20teol%C3%B3gicos%20e%20filos%C3%B3ficos/Deus%20em%20Stephen%20Hawking,%201990.pdf


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