Santo Inácio de Antioquia o Portador de Deus

O Portador de Deus

Santo Inácio, o ancião bispo de Antioquia, recebeu acusação e pena capital ante as autoridades por volta do ano de 107. Fora acusado de ter negado a adorar os deuses do Império. Inácio foi enviado à Roma para que sua morte servisse de espetáculo nas comemorações da Vitória sobre os Dácios no Coliseu. A caminho de seu Martírio, Inácio escreveu sete cartas que constituem um dos mais preciosos documentos do Cristianismo antigo.

Inácio nasceu por volta do ano 30 ou 35. Nas cartas que escreveu, ele mesmo diz repetidamente que possui a alcunha de “Portador de Deus”, o que indica o respaldo que tinha na comunidade cristã. Séculos depois, devido à variações nas traduções, começou-se a falar de Inácio como “Levado por Deus”, de onde surgiu a Lenda que Inácio teria sido o menino a quem Jesus colocou no colo no meio da multidão que o rodeava.

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O Cristianismo Em Antioquia

Antioquia certamente merece ser citada entre as cidades mais proeminentes do mundo antigo. O historiador Flávio Josefo afirmou que Antioquia merece o posto de terceira cidade mais importante do Império, ficando atrás apenas de Roma e Alexandria.Inácio de Antioquia

Na época de Inácio, Antioquia que fora fundada como cidade grega em 300 A.C, era capital da província romana da Síria, com cerca de quinhentos mil habitantes. Inácio se referia a si mesmo como bispo da Síria , aparentemente tendo bastante orgulho da opulência de sua cidade natal e região.

Era chamada de “A Bela e a Dourada”, a “Rainha do Oriente” por sua localização e por seus edifícios magníficos. Localizada a cerca de 24 quilômetros do porto mediterrâneo de Selêucia, ela fica na margem norte do Rio Orontes em um vale largo e fértil aos pés dos picos cobertos de neve do Monte Silpius.

Durante às perseguições que se seguiram ao apedrejamento de Estevão, muitos cristãos de Jerusalém fugiram para Antioquia onde pregaram para judeus que falavam grego (helenistas) e para gregos (helenos).

Foi em Antioquia que os seguidores de Jesus foram chamados de cristãos  pela primeira vez.  (At 11.26). A cidade é mencionada pela primeira vez em Atos 11 logo após Pedro receber uma visão dizendo-lhe que certos animais considerados impuros pelo judaísmo, agora seriam permitidos como alimento. “Não chameis de impuro ao que Deus purificou”, deixando implícito a aceitação dos gentios como povo de Deus.

Barnabé

Quando a Obra missionário cresceu na cidade, alguns lideres cristãos de Jerusalém ficaram preocupados e enviaram Barnabé para verificar o que estava ocorrendo. Por orientação do Espirito Santo, ele imediatamente reconheceu o trabalho entre os gentios como obra da Graça Divina.

Barnabé fortaleceu grandemente os laços de amizade entre a Congregação de Antioquia e a Igreja mãe em Jerusalém.  Paulo, depois de sua conversão, se reunião ali com Barnabé e ensinou a Igreja dali durante um ano. Barnabé e Paulo levaram o dinheiro da oferta de ajuda para Jerusalém. (At 11.27-30).

Por fim, o Espírito Santo ordenou à Igreja de Antioquia: “Separai-me Barnabé e Paulo para a Obra a qual os tenho chamado” (At 13.2). Foi de Antioquia que Paulo e seus companheiros partiram para levar o evangelho de boas novas tanto para judeus como para gentios.

O Caminho de Santo Inácio para Roma.

Não se sabe exatamente por que Inácio foi condenado à execução pelos romanos. É provável que um Terremoto em 115 d.C tenha causado um alvoroço na cidade contra os cristãos  que foram acusados de irritarem os deuses, e o bispo da cidade pagou pela culpa.

Qualquer que tenha sido a razão oficial da prisão do bispo, Inácio foi levado acorrentado de Antioquia até Roma passando pela região que hoje é o sul da Turquia. O que chama a atenção é o fato de que até a cidade de Filipos seu percurso foi praticamente idêntico ao da terceira viagem missionária do Apóstolo Paulo.

Santo Inacio o Portador de DeusApesar de alguns amigos de Inácio terem subornado os soldados para que fossem cordiais com ele, o tratamento que deram foi terrível:

 

 

 

 

Desde a Síria, venho combatendo com feras até Roma, por terra e por mar, de noite e de dia, preso a dez leopardos, isto é, a um destacamento de soldados, que se tornam piores quando se lhes faz o bem. Por seus maus tratos, porém, estou sendo mais instruído, mas nem por isso estou justificado. (Romanos 5.1). 

A Caminho de Roma, Santo Inácio e sua escolta passaram pela Asia Menor. Vários Cristãos da localidade vieram vê-lo. Inácio os recebeu, tinha com ele um amanuense cristão que escrevia as cartas que ele ditava. Todas as pessoas podiam visitar o ancião pois na época não havia uma perseguição geral contra os cristãos, a condenação só recaia em quem fosse acusado por alguém.

As Cartas de Santo Inácio de Antioquia

As sete cartas de Inácio surgiram em sua maior parte por resultado dessas visitas. A partir de Esmirna, Inácio escreveu cartas às cidades de Magnésia, Trales e Éfeso, essa última enviou uma delegação numerosa comandada pelo bispo Onésimo que pode ter sido o Onésimo da epístola de Filemon. Santo Inácio

Em Trôade, escreveu outras três cartas, uma à Igreja de Esmirna, outra ao bispo Policarpo de Esmirna, e outra à Igreja de Filadélfia. De Esmirna escreveu sua carta mais famosa que foi endereçada à Igreja de Roma. Inácio já não via com bons olhos um acordo de libertação, pois já estava pronto pra selar seu testemunho com sangue, vejamos:

Temo vossa bondade, que pode me causar dano. Pois vós podeis fazer com facilidade o que projetais; mas, se vós não prestardes atenção ao que vos peço, ser-me-á muito difícil alcançar a Deus (Romanos 1.2).

Inácio quer sofrer por Cristo e ser imitador de sua Paixão, não quer que a Igreja Romana se empenhe por sua liberdade, mas que ela ore para Deus lhe dar força para enfrentar toda a prova:

Escrevo a todas as Igrejas e insisto junto a todas que morro de boa vontade por Deus, se vós não mo impedirdes. Suplico-vos, não vos transformeis em benevolência inoportuna para mim. Deixai-me ser comida para as feras, pelas quais me é possível encontrar Deus. Sou trigo de Deus e sou moído pelos dentes das feras, para encontrar-me como pão puro de Cristo.  Acariciai antes as feras, para que se tornem meu túmulo e não deixem sobrar nada de meu corpo, para que na minha morte não me torne peso para ninguém. Então de fato serei discípulo de Jesus Cristo, quando o mundo nem mais vir meu corpo. Implorai a Cristo em meu favor, para que por estes instrumentos me faça vítima de Deus. 3 Não é como Pedro e Paulo que vos ordeno. Eles eram apóstolos, eu um condenado; aqueles, livres, e eu até agora escravo. Mas, quando tiver padecido, tornar-me-ei alforriado de Jesus Cristo, e ressuscitarei n’Êle, livre. E agora, preso, aprendo a nada desejar. (Romanos 4.1). 

Pouco tempo depois da chegada de Inácio em Roma, o bispo Policarpo pedia aos Filipenses informações sobre o seu destino, não se sabe o que os de Filipos responderam, mas tudo parece indicar que Inácio morreu como esperava sendo um mártir de Cristo.

Reflexões sobre Inácio de Antioquia.

Monoepiscopado

Inácio é considerado o primeiro defensor do “monoepiscopado”, em que um único bispo serve a toda a comunidade cristã de uma região. O bispo passa então a ser o pastor principal de todo um aglomerado urbano assistido por anciãos que eram denominados presbyteroi. No Novo testamento os termos episkopos e presbyteros se intercambiavam para designar os anciãos de uma congregação.

Santo Inácio de Antioquia o portador de DeusEntretanto, para Inácio, os ofícios de bispo, presbítero e diácono seguiam uma hierarquia específica. O único bispo de uma cidade pastoreava seu rebanho com a ajuda de Presbíteros que por sua vez eram auxiliados por Diáconos.

Por que Inácio de Antioquia fez essa mudança? Usar essa mudança como uma apologia ao catolicismo romano é falta de conhecimento e anacronismo. Essa mudança não veio para adornar os bispos com roupas extravagantes e investi-los de autoridades sobre os leigos. Inácio fez isso como uma solução encontrada para a união cristã e combate à falsas doutrinas.

Para Santo Inácio, a harmonia existente entre cristãos de uma comunidade que amam seu bispo e lhe obedecem, e por outro lado a abnegação do pastor por seu rebanho é reflexo da harmonia entre o Pai Celeste e seu Filho obediente. Além disso, o monoepiscopado funcionava para assegurar que a mensagem verdadeira do Senhor Jesus Cristo fosse protegida de variadas heresias.

Santo Inácio contra Gnósticos e Judaizantes

Para os Gnósticos o Corpo de Jesus Cristo não era real, de modo que não ligavam para as realizações de Jesus no mundo material. Não gostavam da ideia de seu sofrimento e morte na cruz. Para eles, Jesus era o revelador de declarações místicas sobre a esfera sobrenatural. As ações de Deus na historia não possuíam nenhum valor.

Por outro lado, judeus legalistas não conseguiam perceber como o Sacrifício da Cruz foi um ato definitivo. Desejavam manter velhas exigências da Lei Mosaica e não entendiam a mudança salvífica provocada pela ressurreição de Jesus.

Os crentes em Antioquia estavam atraídos ou divididos pelas duas doutrinas errôneas. Faltava em Antioquia uma unidade que advém de uma compreensão verdadeira da pessoa e da Obra de Jesus Cristo. Para a resolução do Dilema, Inácio recorreu à Bíblia, mais especificamente aos escritos e teologia de Paulo

Inácio de Antioquia e Gálatas.

Baseado na Epístola de Gálatas, Inácio enfatizava que o exercício da Graça Divina tem de produzir necessariamente o serviço amoroso dentro do corpo. Teologia sempre deve andar de mãos dadas com a piedade. Conhecer a Deus implica ama-lo e toda sua criação. A mente e o coração devem estar interligados.Gálatas

Outra compreensão importante que Inácio absorveu da doutrina Paulina foi quanto à boa organização de uma Igreja. Igrejas bem dirigidas permanecem firmes na verdade. As Epístolas pastorais do Apóstolo, exaltam os lideres das igrejas como o principal fator contra as falsas doutrinas. Exortar na sã doutrina e o convencimento dos opositores são qualificações do bispo relacionadas na Carta a Tito.

Em 1 Timóteo, o norte do Pensamento de Paulo é o mesmo, em que os perigos de uma teologia falsa são apresentados. Paulo valorizava muito a ordem nas comunidades cristãs. Elas deviam ser geridas por pastores cheios de graça e autoridade.

Carta de Santo Inácio aos Romanos:

Inácio, também chamado Teóforo, à Igreja que recebeu misericórdia pela grandeza do Pai altíssimo e de Jesus Cristo Seu Filho único, Igreja amada e iluminada pela vontade d’Aquêle que escolheu todos os seres, isto é, segundo a fé e a caridade de Jesus Cristo nosso Deus, ela que também preside na região da terra dos romanos, digna de Deus, digna de honra, digna de ser chamada bem-aventurada, digna de louvor, digna de êxito, digna de pureza, e que preside à caridade na observância da lei de Cristo e que leva o nome do Pai. Saúdo-a também em nome de Jesus Cristo, filho do Pai. Aos que aderem a todos os seus mandamentos segundo a carne e o espirito, inabalàvelmente cumulados e confirmados pela graça de Deus, purificados de todo colorido estranho, desejo todo o bem e irrepreensível alegria em Cristo Jesus nosso Deus.

1.

1 Pela oração, me foi concedida por Deus a graça de um dia contemplar vossos rostos dignos de Deus. Com insistência havia implorado tal favor. Prêso em Cristo Jesus, espero abraçar-vos, se for da vontade d’Êle, que eu mereça chegar ao têrmo. 2 Deu certo o comêço. Oxalá consiga a graça de receber sem impedimento minha herança. É que temo não venha prejudicar-me vossa caridade. Pois a vós é fácil realizar o que pretendeis, enquanto é difícil para mim encontrar-me com Deus, caso vós não me poupeis.

2.

1 Não quero que procureis agradar a homens, mas que agradeis a Deus, como de fato agradais. Nem eu terei jamais igual oportunidade de chegar a Deus, nem vós, caso calardes, jamais haveis de ligar vosso nome a obra melhor. Pois, se calardes a meu respeito, serei palavra de Deus; se porém amardes minha carne, não passarei de novo a ser senão uma voz. 2 Não queirais favorecer-me, senão deixando imolar-me a Deus, enquanto há um altar preparado, para formardes pelo amor um côro em homenagem a Deus e cantardes ao Pai em Jesus Cristo, por que Deus se dignou conceder de o bispo da Síria encontrar-se no Ocidente vindo do Oriente. É maravilhoso o ocaso: vir do ocaso do mundo em direção a Deus, para levantar-me junto a Êle.

3.

1 Jamais tivestes inveja de alguém, instruístes sim a outrem. É meu desejo que guardem sua fôrça as lições que inculcais a vossos discípulos. 2 Pedi em meu favor ùnicamente a fôrça exterior e interior, a fim de não apenas falar mas também querer, de não apenas dizer-me cristão, mas de me manifestar como tal. Pois, se me manifestar como tal também posso chamar-me assim e ser fiel, na hora em que já não for visível para o mundo. 3 Nenhuma ostentação é boa, pois o nosso Deus, Jesus Cristo, aparece mais desde que está oculto no Pai. O cristianismo não é o resultado de persuasão, mas grandeza, justamente quando odiado pelo mundo.

4.

1 Escrevo a todas as Igrejas e insisto junto a todas que morro de boa vontade por Deus, se vós não mo impedirdes. Suplico-vos, não vos transformeis em benevolência inoportuna para mim. Deixai-me ser comida para as feras, pelas quais me é possível encontrar Deus. Sou trigo de Deus e sou moído pelos dentes das feras, para encontrar-me como pão puro de Cristo. 2 Acariciai antes as feras, para que se tornem meu túmulo e não deixem sobrar nada de meu corpo, para que na minha morte não me torne pêso para ninguém. Então de fato serei discípulo de Jesus Cristo, quando o mundo nem mais vir meu corpo. Implorai a Cristo em meu favor, para que por êstes instrumentos me faça vítima de Deus. 3 Não é como Pedro e Paulo que vos ordeno. Êles eram apóstolos, eu um condenado; aquêles, livres, e eu até agora escravo. Mas, quando tiver padecido, tornar-me-ei alforriado de Jesus Cristo, e ressuscitarei n’Êle, livre. E agora, prêso, aprendo a nada desejar.

5.

1 Desde a Síria, venho combatendo com feras até Roma, por terra e por mar, de noite e de dia, prêso a dez leopardos, isto é, a um destacamento de soldados, que se tornam piores quando se lhes faz o bem. Por seus maus tratos, porém, estou sendo mais instruído, mas nem por isso estou justificado. 2 Oxalá goze destas feras que me estão preparadas; rezo que se encontrem bem dispostas para mim: hei de instigá-las, para que me devorem depressa, e não aconteça o que aconteceu com outros que, amedrontadas, me não toquem. Se elas por sua vez não quiserem de boa vontade, eu as forçarei. 3 Perdoai-me: sei o que me convém; começo agora a ser discípulo. Coisa alguma visível e invisível me impeça que encontre a Jesus Cristo. Fogo e cruz, manadas de feras, quebraduras de ossos, esquartejamentos, trituração do corpo todo, os piores flagelos do diabo venham sôbre mim, contanto que encontre a Jesus Cristo.

6.

1 De nada me valerão os confins do mundo nem os reinos dêste século. Maravilhoso é para mim morrer por Jesus Cristo, mais do que reinar até aos confins da terra. A Ele é que procuro, que morreu por nós; quero Aquêle que ressuscitou por nossa causa. Aguarda-me o meu nascimento. 2 Perdoai-me, irmãos: não queirais impedir-me de viver, não queirais que eu morra; ao que quer ser de Deus não o presenteeis ao mundo nem o seduzais com a matéria. Permiti que receba luz pura: quando lá chegar serei homem. 3 Permiti que seja imitador do sofrimento de meu Deus. Se alguém o possui dentro de si, há de saber o que quero e se compadecerá de mim, porque conhece o que me impulsiona.

7.

1 O príncipe deste século quer arrebatar-me e perverter o pensamento voltado para Deus. Ninguém dos presentes queira auxiliá-lo. Passai antes para o meu lado, isto é, para o de Deus. Não tenhais a Jesus Cristo na bôca, para irdes desejar o mundo. 2 Não habite inveja em vosso meio. Nem que eu, em pessoa, vos implorasse, não deveríeis obedecer-me: obedecei antes ao que vos escrevo, pois eu o faço como alguém que vive e anela morrer. Meu amor está crucificado e não há em mim fogo para amar a matéria; pelo contrário, água viva, murmurando dentro de mim, falando-me ao interior: Vamos ao Pai! 3 Não me agradam comida passageira, nem prazeres desta vida. Quero pão de Deus que é carne de Jesus Cristo, da descendência de Davi, e como bebida quero o sangue d’Êle, que é Amor incorruptível.

8.

1 Já não quero viver à maneira de homens. É o que no entanto acontecerá, caso me apoiardes. Apoiai, para também receberdes apoio. 2 Eu vo-lo peço em poucas palavras: Crede-me, Jesus Cristo, por Sua vez, há de manifestar-vos que digo a verdade, pois é Êle a bôca sem mentiras, pela qual o Pai falou a verdade. 3 Rezai por mim, para que chegue até lá. Não vos escrevi segundo a carne, mas segundo o pensamento de Deus. Se sofrer, será por vossa benevolência; se fôr reprovado, será por causa do vosso ódio.

9.

1 Lembrai-vos em vossa oração da Igreja na Síria, a qual, em meu lugar, tem Deus como pastor. Só Jesus Cristo será seu bispo e a vossa caridade. 2 Eu por minha parte me envergonho de ser chamado um dêles; pois não o mereço em nada, sendo o último dentre êles e um abortivo. Mas, por misericórdia, sou alguém, se chego até Deus. 3 Saúda-vos o meu espírito e a caridade das Igrejas que me receberam em nome de Jesus Cristo e não como simples transeunte. Até mesmo aquelas Igrejas que não se encontravam em meu roteiro, segundo a carne, vieram de tôdas as cidades ao meu encontro.

10.

1 Escrevo estas coisas a vós de Esmirna, por obséquio dos efésios dignos de serem bem-aventurados. Entre muitos outros, encontra-se comigo também Crocos, nome que me é querido. 2 Quanto aos que me precederam da Síria a Roma para a glória de Deus, espero que com êles tenhais travado conhecimento: comunicai-lhes também que estou perto. Todos êles são dignos de Deus e de vós; conviria que os confortásseis em tudo. 3 Esta minha carta data do nono dia das calendas de setembro. Passar bem, até o fim, à espera de Jesus Cristo.

CARTA AOS EFÉSIOS

Inácio, também chamado Teóforo, àquela que é bendita em grandeza na plenitude de Deus Pai, predestinada antes dos séculos a existir em todo o tempo, unida para uma glória imperecível e imutável, e eleita na Paixão verdadeira, pela vontade do Pai e de Jesus Cristo nosso Deus – à Igreja digna de bem-aventurança, que vive em Éfeso da Ásia, todos os bens em Jesus Cristo e os cumprimentos numa alegria impoluta.

1.

1 Tomei conhecimento em Deus de vosso nome tão apreciado, que granjeastes por uma apresentação correta, baseada na fé e caridade em Jesus Cristo nosso Salvador. Sendo imitadores de Deus, reanimados no sangue de Deus, levastes a têrmo a obra que vos é congênita. 2 Assim ouvindo que eu vinha da Síria, prêso pelo Nome e pela esperança que nos são comuns, confiando chegar até Roma para combater as feras, graças à vossa oração, a fim de ter a felicidade de tornar-me discípulo, vós vos apressastes em ver-me. 3 Recebi pois tôda a vossa grande comunidade em nome de Deus na pessoa de Onésimo, dotado de indizível caridade e vosso bispo segundo a carne. Peço-vos que o ameis em Jesus Cristo e que a êle todos vos assemelheis. Bendito Aquêle que vos fêz a graça, já que vos mostrastes dignos de possuirdes tal bispo.

2.

1 Quanto a Burrus, meu companheiro de serviço e vosso diácono bendito em tôdas as coisas segundo o coração de Deus, pediria que continue a meu lado para honra vossa e de vosso bispo. Mas também Crocos, digno de Deus e de vós, a quem acolhi como prova de vosso amor, confortou-me êle de tôda a sorte, como também o Pai de Jesus Cristo lhe há de dar confôrto junto com Onésimo, Burrus, Euplos e Fronton, pois em suas pessoas vi a todos vós na caridade. 2 Gostaria de merecer a graça de alegrar-me convosco em tudo. Bem, por isso é que convém glorificar de tôda sorte a Jesus Cristo que vos tem glorificado, para que, reunidos em uma só submissão, sujeitos ao bispo e ao presbitério, vos santifiqueis em tôdas as coisas.

3.

1 Não vos dou ordens como se fôra alguém. Mesmo que carregue os grilhões pelo Nome, ainda não cheguei à perfeição em Jesus Cristo. Pois agora é que começo a instruir-me e vos falo como a meus condiscípulos. Eu de fato deveria ser ungido por vós com fé, exortações, paciência, grandeza d’alma. 2 Mas, desde que a caridade não me permite calar-me sôbre vós, tomei a dianteira de exortar-vos a correr de acôrdo com o pensamento de Deus. Pois Jesus Cristo, nossa vida inseparável, é o pensamento do Pai, como por sua vez os bispos, estabelecidos até os confins da terra, estão no pensamento de Jesus Cristo.

4.

1 Segue daí, que vos convém avançar junto, de acôrdo com o pensamento do bispo, como aliás fazeis. Pois vosso presbitério digno de tão boa reputação, digno que é de Deus, sintoniza com o bispo como cordas com a cítara. Por isso, no acorde de vossos sentimentos e em vossa caridade harmoniosa, Jesus Cristo é que é cantado. 2 Mas também, um por um, chegais a formar um côro, para cantardes juntos em harmonia; acertando o tom de Deus na unidade, cantais em uníssono por Jesus ao Pai, a fim de que vos escute e reconheça pelas vossas boas obras, que sois membros de seu Filho. Vale assim a pena viver em unidade intangível, para que a tôda hora também participeis de Deus.

5.

1 Pois, se em tão curto lapso de tempo tive tal intimidade com vosso bispo, não em sentido humano mas espiritual, quanto mais devo felicitar-vos por estardes tão profundamente ligados a êle como a Igreja a Jesus Cristo e como Jesus Cristo ao Pai, para que tôdas as coisas estejam em sintonia na unidade. 2 Não se iluda ninguém. Se não se encontrar no interior do recinto do altar, ver-se-á privado do pão de Deus. Vêde, se a oração de um e dois possui tal fôrça, quanto mais então a do bispo e de tôda a Igreja! 3 Aquêle que não vem à reunião comum já se revela como orgulhoso e se julgou a si próprio, pois está escrito: “Deus se opõe aos orgulhosos”. Por conseguinte, cuidemo-nos de não nos opormos ao bispo, para estarmos submissos a Deus.

6.

1 E quanto mais alguém percebe que o bispo se cala, mais o respeite. Pois aquêle a quem o dono da casa delega para a administração é preciso que o recebamos como receberíamos ao que o enviou. Torna-se pois evidente que se deve olhar para o bispo, como para o próprio Senhor. 2 De fato, porém, o mesmo Onésimo exalta vossa boa disciplina em Deus, .dizendo que viveis todos conforme à verdade e que entre vós não há heresia que chegue a tomar pé. Antes pelo contrário, a ninguém mais prestais ouvido, a não ser a Jesus Cristo, que fala na verdade.

7.

1 Há os que costumam, por um ardil pernicioso, servir-se por tôda parte do Nome, mas praticam coisas indignas de Deus. A êstes evitareis como a animais selvagens. São realmente cães raivosos, que mordem traiçoeiramente. É preciso precaver-vos de suas mordeduras, difíceis de curar. 2 Um é o médico, em carne e espirito, gerado e não gerado, aparecendo na carne como Deus, na morte vida verdadeira, tanto de Maria como de Deus, primeiro capaz de sofrer, depois impassível, Jesus Cristo Senhor Nosso.

8.

1 Que ninguém vos iluda pois. Nem vos deixeis aliás iludir, sendo todo inteiros de Deus. Pois, se nenhuma intriga se armou entre vós, que vos possa atormentar, é sinal de que viveis segundo Deus. Sou vossa vítima e me ofereço em sacrifício por vossa Igreja, efésios, que será celebrada pelos séculos. 2 Os carnais não podem praticar obras espirituais, nem os espirituais obras carnais, como nem a fé pratica as obras da infidelidade nem a infidelidade as da fé. Mas também aquilo que praticais, segundo a carne, é espiritual, pois fazeis tudo em Jesus Cristo.

9.

1 Soube de pessoas que por lá passaram, fazendo-se portadoras de más doutrinas: não lhes permitistes espalhá-las entre vós, tapando os ouvidos para não acolher as sementes por êles espalhadas, sabendo que sois pedras do templo do Pai, preparadas para a construção de Deus Pai, alçadas para as alturas pela alavanca de Jesus Cristo, alavanca que é a Cruz, servindo-vos do Espírito Santo como de um cabo. Vossa fé por um lado é o guia, enquanto a caridade se transforma em caminho que leva para cima, até Deus. 2 Sois assim todos companheiros de viagem, portadores de Deus, portadores de um templo, portadores de Cristo, portadores do que é santo, adornados em todos os sentidos com os preceitos de Jesus Cristo. Alegro-me por isso convosco, porque tive a honra de falar-vos através dessa carta e de vos felicitar, porque, segundo a nova vida, nada amais senão sòmente a Deus.

10.

1 Mas também pelos demais homens rezai sem cessar. Pois nêles existe esperança de conversão, de chegarem a Deus. Permiti-lhes que se instruam junto a vós por vossas obras. 2 Diante de suas explosões de cólera, vós sereis mansos; diante de sua presunção, se reis humildes; diante de suas blasfêmias, oferecereis orações; diante dos erros dêles, manter-vos-eis firmes na fé; diante de sua selvageria, sereis. pacíficos, sem procurar imitá-los. 3 Que nos encontrem como irmãos pela bondade. Esforcemo-nos por sermos imitadores do Senhor: quem mais do que Êle foi injustiçado? quem mais despojado? quem mais desprestigiado? Assim não seja encontrada entre vós planta. alguma do diabo, mas que em tôda pureza e temperança, permaneçais em Jesus Cristo, corporal e espiritualmente.

11.

1 Chegamos aos últimos tempos: resta envergonharmo-nos, temermos a longanimidade de Deus, para que ela não se transforme para nós em condenação. Ou temeremos a ira vindoura, ou amaremos a graça presente. Uma das duas. Só o fato de nos encontrarmos em Cristo Jesus nos garantirá entrada para a vida verdadeira. 2 Fora dêle, nada tenha valor para vós. É n’Êle que carrego os grilhões, estas pérolas espirituais. Com elas gostaria de ressuscitar, graças à vossa oração, na qual espero ter sempre parte para compartilhar também a herança dos cristãos de Éfeso, que também sempre estiveram unidos aos Apóstolos na fôrça de Jesus Cristo.

12.

1 Sei quem sou e a quem escrevo. Eu, um condenado; vós, os que alcançastes misericórdia. Eu, em perigo; vós, seguros. 2 Vós sois o lugar de trânsito dos que são assumidos para Deus, iniciados nos mistérios com Paulo, o santificado, que recebeu testemunho, e mereceu chamar-se bem-aventurado, em cujas pegadas gostaria de encontrar-me na hora de estar com Deus, êle que em tôdas as cartas de vós se lembra em Cristo Jesus.

13.

1 Cuidai pois de reunir-vos com mais freqüência, para dar a Deus ação de graças e louvor. Pois, quando vos reunis com freqüência, abatem-se as fôrças de Satanás e desfaz-se o malefício, pela vossa união na fé. 2 Nada melhor que a paz, que aniquila tôda guerra de podêres celestes ou terrestres.

14.

1 Nada disso constitui novidade, se mantiverdes de modo perfeito em Jesus Cristo a fé e a caridade, que são o comêço da vida e seu fim. Pois o comêço é a fé e o fim a caridade. Ambas reunidas são Deus, enquanto que tudo o mais é conseqüência para a perfeição humana. 2 Ninguém peca enquanto professa a fé, ninguém odeia enquanto possui a caridade. Conhece-se a árvore pelos seus frutos; assim os que professam ser de Cristo serão reconhecidos pelas obras. Pois nesta hora não é de profissão de fé que se trata, mas de nos mantermos na prática da fé até ao fim.

15.

1 É melhor calar-se e ser do que falar e não ser. É maravilhoso ensinar, quando se faz o que se diz. Assim, um é o Mestre “que falou e tudo foi feito”; também aquilo que realizou em silêncio é digno do Pai. 2 Quem de fato possui a Palavra de Jesus pode até ouvir-lhe o silêncio; para ser perfeito, para agir pelo que fala e ser reconhecido pelo que cala. 3 Nada escapa ao Senhor; antes, o que é segrêdo para nós está perto d’Êle. Façamos pois tudo como se Êle em nós morasse, para sermos seus templos e Ele nosso Deus em nós. E é essa a realidade; e ela se manifestará aos nossos olhos, se o amarmos devidamente.

16.

1 Não vos iludais, meus irmãos, os corruptores da família não herdarão o Reino de Deus. 2 Pois, se pereceram os que praticavam tais coisas segundo a carne, quanto mais os que perverterem a fé em Deus, ensinando doutrina má, fé pela qual Jesus Cristo foi crucificado? Um tal, tornando-se impuro, marchará para o fogo inextingüível, como também marchará aquêle que o escuta.

17.

1 Por isso, recebeu o Senhor unção sôbre a cabeça para exalar em favor da Igreja o perfume da incorrupção. Não vos deixeis ungir pelo mau odor da doutrina do príncipe dêste mundo, de forma que vos leve cativos para longe da vida que vos espera. 2 Por que não nos tornamos prudentes, aceitando o conhecimento de Deus, isto é, Jesus Cristo? Por que morrermos tolamente, desconhecendo o dom que o Senhor nos enviou de verdade?

18.

1 Meu espírito é vítima destinada à Cruz, e esta é escândalo para os incréus; para nós porém salvação e vida eterna. Onde se encontra o sábio? Onde o pesquisador? Onde a fama dos assim chamados intelectuais? 2 Pois nosso Deus, Jesus Cristo, tomou carne no seio de Maria segundo o plano de Deus, sendo de um lado descendente de Davi, provindo por outro do Espírito Santo. Nasceu, foi batizado, para purificar a água pela sua Paixão.

19.

1 Permaneceu oculta ao príncipe dêste mundo a virgindade de Maria e seu parto, como igualmente a morte do Senhor: três mistérios de grande alcance, que se processaram no silêncio de Deus. 2 Como então foram êles manifestados aos séculos? Um astro brilhou no céu, mais que todos os astros; sua luz era inenarrável e sua novidade suscitou estranheza; tôdas as demais estrêlas por sua vez junto com o sol e a lua formaram côro em tôrno do astro, êle no entanto projetava mais luz que todos os demais; produziu-se confusão: donde viria a novidade, tão diversa dêles próprios? 3 A conseqüência disso foi que tôda a magia se desfez e que desapareceu tôda cadeia de maldade; a ignorância se dissipou, o antigo reinado se destruiu, quando Deus apareceu em forma humana, para a novidade da vida eterna; começou a realizar-se o que fôra decidido junto a Deus. Desde então tudo se movimentou a um tempo, porque se preparava a destruição da morte.

20.

1 Se Jesus Cristo, pela vossa oração, me tornar digno e se fôr de Sua vontade, num segundo escrito que desejo compor para vós, hei de esclarecer o que iniciei, a saber o plano da salvação, em relação ao homem nôvo, Jesus Cristo, na fé para Êle e no amor para com Êle, em Sua Paixão e Ressurreição. 2 Sobretudo se o Senhor me revelar, que todos, em particular e em comum, na graça que procede do Nome, vos reunis na mesma fé e em Jesus Cristo, que descende segundo a carne de Davi, filho do homem e filho de Deus, para obedecermos ao bispo e ao presbitério numa concórdia indivisível, partindo um mesmo pão, que é o remédio da imortalidade, antídoto contra a morte, mas vida em Jesus Cristo para sempre.

21.

1 Sou preço de resgate para vós e para os que enviastes para honra de Deus a Esmirna, donde também vos escrevo, em sinal de gratidão ao Senhor e como prova de amor a Policarpo como a vós. Lembrai-vos de mim, como também Jesus Cristo se lembra de vós. 2 Rezai pela Igreja da Síria, donde sou levado prêso para Roma. Sendo o último dos fiéis de lá fui julgado digno de servir à honra de Deus. Saudações em Deus Pai e em Jesus Cristo, nossa esperança comum.

Referências:

Conhecendo os Pais da Igreja. Uma introdução Evangélica. Bryan M. Litfin

Dicionário Bíblico Wycliffe.

História Ilustrada do Cristianismo. Justo L. Gonzalez

http://www.cristianismo.org.br/

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1 comentário

São Justino o Mártir · 29/07/2020 às 19:34

[…] Mesmo jovem, Justino era um amente da Filosofia, por isso, por volta dos seus 30 anos rumou para uma cidade grande para estudar com grandes mestres de escolas filosóficas. Provavelmente, essa cidade foi Éfeso, pois o historiador Eusébio o cita algumas vezes lá. Talvez ali o futuro Mártir ficou sabendo da história de outro Mártir: Inácio de Antioquia.  […]

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