A Palavra de Deus é o ponto de partida e autoridade final da Teologia de Lutero. Na Bíblia, ele baseou suas aulas de Teologia e encontrou as respostas para as suas angústias espirituais e existenciais. Contudo, Lutero não foi um biblista radical, pois para ele a Palavra de Deus é muito mais que a Bíblia.
Para Lutero, a Palavra de Deus se encarnou em Jesus Cristo, que por sua vez é a revelação máxima de Deus. Em Jesus, Deus é conhecido. Em Jesus, Deus venceu o Maligno que nos aprisionava. A Revelação de Deus também é o Triunfo de Deus.
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A afirmação de Lutero se baseia no Evangelho de João: “No princípio era o Verbo (Palavra) e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus”. Isto também pode ser visto em Gênesis, em que a Palavra de Deus é a força que cria: “Disse Deus…”, assim quando Deus fala, Ele cria o que pronuncia.
A Bíblia é a Palavra de Deus, não porque ele seja infalível. A Bíblia é a Palavra de Deus porque nela, Jesus chega até ser humano. Quem lê a Bíblia e não encontra nela Jesus Cristo, não chegou a entender a Palavra de Deus.
Por isso, Lutero, ao mesmo tempo em que pregava a Autoridade das Escrituras, também fazia comentários pejorativos a certas partes da Bíblia. A Epístola de Tiago, recebia suas críticas, pois dizia que ela parecia “pura palha”, pois ela não trata do evangelho, mas sim, de uma série de regras de conduta.
No entanto, Lutero não estava disposto a retirar do Cânon, certos livros que criticava, mas confessava abertamente que era difícil ver Jesus Cristo neles e, consequentemente, esses livros tinham menos valor para ele.
A ideia da Palavra de Deus ser Jesus Cristo, era a base do argumento de Lutero a um dos principais postulados dos católicos. Estes afirmavam que, como a Igreja tinha determinado quais livros deviam compor o Cânon, a Igreja então tinha soberania sobre as Escrituras.
Lutero dizia que nem a igreja criou a Bíblia e nem a Bíblia criou a Igreja, mas ambas forma criadas pelo Evangelho. A autoridade não está na Bíblia, nem na Igreja, mas no Evangelho que é a mensagem de Jesus Cristo, que é a Palavra de Deus encarnada.
Visto que a Bíblia dá testemunho mais fiel do Evangelho do que a Igreja corrompida do papa e das tradições medievais, a Bíblia é superior sobre a igreja e essas tradições, embora também foi a igreja que nos primeiros séculos determinou o conteúdo do Canon Bíblico.
Lutero e o Conhecimento de Deus
O reformador acredita que é possível ter certo conhecimento de Deus por por meios puramente racionais ou naturais. Esse conhecimento permite ao ser humano entender que Deus existe e distinguir entre o bem e o mal.
No entanto, para Lutero, a filosofia não era o verdadeiro conhecimento de Deus. Todos os esforços humanos para elevar-se ao espiritual e conhecer a Deus são totalmente inférteis.
Teologia da Glória x Teologia da Cruz
Tentar ver Deus como Ele é, em sua própria Glória, sem levar em conta a distância descomunal que separa a criatura de seu Criador é apenas uma projeção da mente humana. Enquadrar Deus nesses termos, no final das contas, não é mais do que fazer Deus à nossa imagem e pretender que Deus seja como nós mesmos desejamos que ele seja.
Lutero propõe que se troque a Teologia da Glória pela Teologia da Cruz, já que foi na cruz que ocorreu a suprema revelação de Deus. Deus na cruz se revela de maneira radicalmente distinta do que se poderia imaginar. Deus, na cruz, destrói todas as nossas ideias preconcebidas de gloria divina.
A Lei e o Evangelho
Deus em sua Revelação, se deixa conhecer de duas maneiras: a Lei e o Evangelho. Essa Revelação não acontece de maneira sucessiva, ou seja, que primeiro vem a Lei e depois o Evangelho, mas que a revelação é de uma só vez: Palavra de Condenação e Graça.
Na Justificação da pela fé, Lutero não entende que Deus seja indiferente mediante ao pecado humano. Pelo contrário, Deus é santo e o pecado lhe causa repugnância. Quando Deus se comunica, o contraste entre sua Santidade e o nosso pecado nos esmaga, isso é a lei.
O Perdão de Deus para conosco está na Sua Palavra do Evangelho e é muito maior do que a Lei esmagadora. É um evangelho que se torna surpreendente em sua força diante da máxima gravidade do pecado.
Comentando sobre o Evangelho de João, afirma Lutero:
” Antes não havia na lei nenhuma delícia para mim. Porém, agora descobri que a Lei é boa e saborosa, e me tem sido dada para que eu viva, e encontro nela meu prazer. Antes me dizia o que devia ser feito. Agora começo a ajustar-me nela. E por isso agora adoro, louvo e sirvo a Deus”.
A dialética entre a lei e o evangelho significa que o cristão é ao mesmo tempo justo e pecador. Quem recebe a justificação pela fé, descobre nela mesma o quanto é pecador e também, nem por essa justificação, o pecador deixa de pecar.
A Justificação não é a ausência de pecado, mas quando Deus nos declara justos é em meio ao nosso próprio pecado e de igual modo o evangelho acontece sempre em meio à lei.
A Igreja e os Sacramentos
Lutero não foi nem o individualista e nem o racionalista que muitos pregam. Muitos historiadores deixaram a entender que Lutero tinha sido um dos precursores do individualismo e do racionalismo. Essa visão faz parte do intuito de mostrar a Alemanha como grande nação mãe da civilização moderna, então muitos transformaram Lutero no grande herói alemão fundador do Modernismo.
Mas isso, não se ajusta à verdade histórica. Lutero distanciou-se muito de ser um racionalista. Muitas vezes se referiu à “porca razão” e “essa rameira, a razão”. Quanto ao individualismo, Lutero dava demasiada importância à igreja para ser um autêntico individualismo.
Apesar do protesto contra as doutrinas aceitas da Igreja e sua intransigência contra as autoridades eclesiásticas. Lutero sempre acreditou que a Igreja era parte importante na teologia cristã. Sou doutrina nesse campo, não era de uma comunhão direta do cristão com Deus, mas sim de uma vida cristã no meio de uma comunidade de fiéis, a qual denominou de “igreja mãe”.
Embora tenha pregado o “sacerdócio real ou universal” em que todo cristão vira sacerdote ao ser batizado, isso não quer dizer que cada ser humano deva isolar-se em si mesmo para buscar a Deus. Se há uma possibilidade de comunicação direta com Deus, também há uma responsabilidade orgânica.
Ser Sacerdote é ser sacerdote para si mesmo, mas também para os demais, assim como os outros o são também para nós. Se já não temos o sacerdócio hierárquico como nosso único caminho para se chegar ao Criador, todavia, precisamos da comunidade dos irmãos, o corpo de Cristo, dentro da qual cada um ajuda a carregar o fardo dos demais.
Dentro dessa Igreja, a Palavra nos chega também através dos sacramentos. Para que um rito seja válido, tem de ser instituído por Jesus Cristo e há de ser sinal físico das promessas celestiais. Portanto, há somente dois sacramentos: O Batismo e a Ceia. Os demais podem até ser ritos benéficos, mas não são sacramentos do Evangelho de Cristo.
Batismo
O batismo tem o significado de morte e ressurreição com jesus Cristo. É muito mais que um sinal, pois por ele e nele somos feitos membros do corpo de Cristo. Batismo e fé andam de mãos dadas, porquanto o rito sem a fé não é válido.
No entanto, não precisamos da fé antes de sermos batizados e por isso também se pode realizar o batismo infantil. A fé é dom de Deus e não obra humana. Na Salvação, a iniciativa é sempre de Deus, por isso se pode batizar crianças mesmo sendo elas incapazes de entender do que se trata.
A Ceia Transubstanciação x Consubstanciação
Lutero rechaçou grande parte da teologia católica sobre a ceia. Opôs-se às missas privadas, à ceia como como repetição do sacrifício de Cristo e à doutrina da transubstanciação. Nem por isso, achava a Ceia um sacramento de pouca importância, para ele, a eucaristia junto com a pregação eram o centro do culto cristão.
Para a Lutero a teologia da Transubstanciação estava presa a categorias aristotélicas, consequentemente, pagãs. Também era a ideia da missa como sacrifico meritório que se opunha à doutrina da justificação pela fé.
Lutero também divergia de alguns protestantes que diziam que a ceia era mero símbolo de realidades espirituais. Para o monge, as Palavras de Jesus: “Isto é o meu corpo”, eram suficientemente claras. Conforme Lutero, na ceia os crentes participam do corpo de Cristo de forma verdadeira e literal.
O Pão continua sendo pão, e o vinho, continua sendo vinho. No entanto, agora estão também neles, o corpo e o sangue de Cristo e o fiel se alimenta deles ao tomar o pão e o vinho. Mais tarde, essa Teoria de Lutero foi denominada de “consubstanciação”, ainda que Lutero nunca se referiu assim à essa sua doutrina.
Zuínglio e Carlstadt, estavam mais inclinados a considerar que a presença de Cristo no Sacramento era apenas simbólica e isso foi motivo de divisão entre luteranos e os reformados e Calvinistas.
Os Dois Reinos: A Igreja e o Estado
Segundo Lutero, Deus estabelecera dois reinos, um sob a lei e outro sob o evangelho. O Estado trabalha com a lei, e sue principal intuito é pôr limites ao pecado da humanidade. O Estado serve para dar freios nos homens maus.
Os cristãos por outro lado estão sob a Lei do Evangelho. Os crentes não devem esperar que o Estado apoie a sua fé e persiga os hereges. Também não devemos esperar que os governantes sejam cristãos. No reino do Evangelho, as autoridades civis não tem poder nenhum.
No entanto, já que o cristão é justificado pela fé, seu pecado continua atuando e portanto também está sujeito ás leis do Estado.
Lutero foi Pacifista?
Para Lutero a verdadeira fé não tem que se impor à lei civil, mas mediante a proclamação da Palavra. Lutero era contra o uso da força pelos principies que o apoiavam na defesa de sua causa. Somente depois de muito relutar é que consentiu no uso das armas contra aqueles que pretendiam esmagar a Reforma.
No entanto, Lutero não foi um pacifista, chegou a chamar seus seguidores às armas contra os Turcos que ameaçavam a Cristandade. Quando diversos grupos e movimentos radicais como camponeses rebeldes e anabatistas intentavam subversões, Lutero pregava que as autoridades civis tinham o dever de esmagá-los.
Tudo isso, mostra que Lutero tinha dúvidas sobre como a fé devia relacionar-se com a vida civil e com a política Essas vacilações acontecem até os dias de hoje na tradição da Teologia Luterana.
Referência do Artigo sobre a Teologia de Martinho Lutero – Pensamento e Doutrina
História Ilustrada do Cristianismo. Justo L Gonzalez. Vida Nova
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